25 novembro, 2011

Completamente incompleto numa noite normal,

Adormeci no meu quarto, numa noite perfeitamente normal e casual sem qualquer tipo de promessas lançadas para o oxigénio tóxico, característica do ambiente em que caminho e descanso a todas as horas. O amor abandonou-me há algum tempo, sem qualquer intenção de voltar num curto período de tempo para me envolver numa segurança apetecível e deliciosa, acabou por levar as malas com todos os objectos que lhe pertenciam e deixou-me um beijo. Um toque ao de leve nos meus lábios para conseguir o meu espírito conseguir dar a volta por cima, com a intenção de me oferecer um início fora dos meus planos. Veio trazer desorganização ao meu bem-estar, às minhas roupas, ao meu coração e aos meus pulmões, fracos no funcionamento desde a manhã em que regressei ao Mundo. As lágrimas queimaram a pele do meu rosto graças ao suposto sal que contém, passadas centenas de horas decidi chorar para uma garrafa de licor com o intuito de saborear-me quando me sentir sozinho. Naquela noite sem qualquer marcação ou intenção de ocorrer um acontecimento especial, acabei por adormecer em cima dos lençóis brancos e com um cobertor sobre as pernas, os ventos gelados andavam a dar cabo dos meus músculos que se ressentiam cada vez mais do frio nórdico (e psicológico).
Sai do meu corpo na hora em que adormeci com os auscultadores nos ouvidos, com a divina Cat Power e a sua voz melancólica e cansada a ecoar-me por todos os tecidos na alma. As ameaças de destruição interior estavam em cima da mesa, o desastre do passado tombava sobre as minhas pernas e coração, na medida em comparar-se a uma jarra recheada de água prestes a cair para um ser humano. Lábios feridos, cabelos desgrenhados e olhos fechados para uma relação sexual com o meu espírito. Elevei-me acima da minha mente e deitei-me sobre o corpo estendido na cama, esse que tinha falta de cuidados da minha parte. Faltavam-me as lágrimas para chorar a separação espiritual que se manifestava na minha existência, com a visão sobre os meus cabelos castanhos, a boca fechada, o peito parado. Como simples personificação de uma parte da minha existência, sob a forma de espírito, tentava agarrar nas minhas mãos para sentir vivacidade, movimento em alguns segundos mas não restava nada. Começou a chover, os meus ouvidos conseguiram detectar, e o coro do meu funeral fez-se soar, a minha agonia continuava à medida que os ponteiros do relógio se moviam.
Sentei-me à janela, a escutar o que a natureza tinha para me revelar enquanto o som das músicas da Cat Power continuavam a bombear o corpo deitado sobre a cama, sem qualquer espécie de vitalidade. A ausência de lágrimas incomodava, magoava. Tratava-se de incapacidade corporal já que me sentia completamente incompleto, nesta ironia de palavras que utilizava e que arranhavam a minha conduta. Completamente incompleto, com a ausência de um sentido para a vida. A natureza cantava-me frustrantemente, sem entender que as cores da minha alma estendiam-se ao preto, ao branco, ao cinzento. Uma inundação infernal rebolava sobre os tapetes, sorrindo maldosamente e apontado o dedo para mim num tom desaprovador. O amor abandonou-me há tanto tempo, o calor deixou o meu coração, o sangue parou – enumerava à medida que cantarolava para espantar os “males de espírito”, na espera de um beijo que reiniciasse a minha vida. Desta vez seria um início planeado, desejado e nunca apareceria ao contrário do que queria. Tenho tantas saudades de um beijo, este pensamento martelava a minha mente quando a tua figura aparecia de surpresa, a visitar os meus sonhos e os meus pesadelos (amor que é amor conhece todos os lados do ser humano que ama, nem que demore anos para espreitar). À janela continuei a cantar, a espantar tudo o que me fazia mal – incluindo as imagens dos beijos alheios que esse amor dava a terceiros, quartos, quintos se fosse preciso – e as lágrimas nunca apareceram, unicamente o vazio que martelava a existência. O corpo morto em cima da cama nunca se mexeu, dentro da normalidade. Não lhe restava nada, apenas a música que ecoava graças aos auscultadores.
Quando um dos meus progenitores apareceu à porta do meu quarto, não me mexi tal como o corpo estendido, a voz dela começou a elevar-se por nascerem pensamentos com raízes venenosas na sua mente. E num acesso de fúria tocou-lhe, tocou-me, sem pressentir vida. Um revestimento de pânico cobriu a voz melancólica, o acesso de raiva desapareceu subitamente e os seus braços enrolaram o meu corpo. Assistia plenamente a tudo, com um copo na mão. O copo que continha uma boa porção do meu sangue. Seria essa a forma de fazer amor comigo, saborear o meu sangue vermelho à medida que um ataque de pânico revestia o quarto. Os coros do funeral continuavam e faziam-me fungar, uma vez que lágrimas nunca apareceriam. Quando esse líquido vital entrou por todos os meus tecidos, cai numa espécie de lógica misturada com algum nível de emoção e sai da janela, ajoelhando-me ao lado do meu corpo.
Volta, meu amor. Que fizeste a ti próprio? Volta, volta para mim. – Os braços delas continuavam a embalar-me, com a mágoa a inflamar as cordas vocais na noite perfeitamente normal e sem qualquer acontecimento programado. Ajoelhei-me ao lado do meu corpo e rezei, como nunca o tinha feito. Rezei para regressar completamente renovado, como se me tivessem beijado apaixonadamente. Os arrepios voltaram, balançavam toda a minha existência. Quando o ar voltou ao corpo, abri os olhos e estava ofegante, com braços à minha volta. Onde estavas? Onde estavas, meu estúpido? - Perguntava-me com amor sob a forma de raiva. Não faço ideia, acho que voltei a nascer.
Cat Power continuou a tocar, a chuva continuou lá fora, a minha progenitora saiu para libertar o medo na casa de banho e o amor abandonou-me. É uma noite normal, como pensei.

20 novembro, 2011

Colaborações (durante a tarde),


Deixo-vos o meu artigo sobre a minha querida Florrie, artista que já tinha mencionado, no Pfashion Royalty. Deliciem-se, meus caros.

E tenham uma óptima semana!



17 novembro, 2011

O canto às desistências temporárias: o início,


Não senti a minha pele no momento em que os olhos tentaram registar e gravar algum tipo de vivacidade no meu quarto, as minhas mãos encontravam-se longe do peito, dos pés, dos olhos ou de qualquer outra zona do meu corpo, descuidado por anos de caça. Na tentativa de guardar a mais pura das naturezas e raízes do amor, os meus pulmões começaram a morrer e a desfazer-se dentro do corpo para dar origem a uma doença crónica, sem qualquer tipo de hipótese de tratamento pela medicina tradicional ou quem sabe moderna (já que todas as ciências estão em constante mudança). Uma doença criada com uma obsessão que dava impulsos eléctricos a todos os meus músculos. Quando tinha desejos relacionados com morte ganhava mais vida e rodopiava nesta existência viciosa, sem qualquer hipóteses de sobreviver.
No dia em que comecei a escrever esta simples memória não me lembro de sentir a minha pele nos segundos iniciais, fugindo a um ritual tão gravado nos meus hábitos elaborados com o passar dos anos. Devia ter algum tipo de alerta biológico, uma simples paragem de segundos da circulação sanguínea ou a falta de batimentos no coração, que me levassem a percepção deste acto, esta ausência de rotina logo pela manhã – tão valorizados e tão glorificados são os hábitos que construi à volta da minha existência, como se fossem uma marca para a minha personalidade. O problema seguinte, que se colocou à volta desta falta de toque na minha própria pele (no meu corpo) foi o relaxamento nas manifestações de amor-próprio, da certa paixão física e individual que experimentava de todas as vezes que os meus dedos passavam pela minha cintura, mal os meus olhos castanhos visualizam algum tipo de luz, tão ausente enquanto o meu quarto se encontra às escuras. Os dedos não deslizaram pelos meus lábios, pressentindo as inseguranças no queixo demasiado puxado para a frente. A língua não tocou em um dos dedos para manifestar a sua presença, não houve oportunidade de dar a entender os benefícios do sentido que possui. As minhas mãos permaneceram esticadas enquanto a minha cabeça repousava na almofada, os cabelos estavam manchados com restos de tinta azul em tons escuros (a última tentativa de pintar os cabelos não tinha corrido bem e a qualidade do material quer capilar quer do produto de pintura não eram com certeza excelentes). Não existiu um toque pessoal nas primeiras horas da manhã, um simples remexer para pressentir vida em todas as outras zonas do corpo – a preguiça transformou-se na dama de honra, transformando anos de cuidado em pleno lixo espiritual. O dramatismo subia com intensidade pelas minhas pernas à medida que colocava o leite dentro de uma taça, com intenção de misturá-lo com cereais logo pela refeição inicial de um novo dia – o slogan de saúde estava longe de fazer parte das minhas intenções, mal acabei de escrever esta frase. Enumero dois problemas que afligiram a minha alma, a quebra de rotina por mais simples que possa ser e o pequeno indício de falta de amor individual. (Salvem-me, meus caros seres humanos, um dia vou afundar-me na minha loucura já que se vai ganhando cada vez mais dimensão).
A doença começou quando a caça natural fez-se pressentir nos meus ossos arruinados futuramente por alguma doença herdada geneticamente. A dança inicia-se de todas as vezes em que a sala de espectáculo silencia-se ou escurece, a leitura de um livro começa quando a segunda pessoa escuta e o amor estreia-se quando o coração pressente. A doença começou quando essa estreia se originou de uma forma natural, num sábado à tarde. A segunda pessoa que haveria de tornar-se primeira graças a muitas demonstrações e declarações, gravadas para sempre num passado que se encontra registado na minha memória.
Oh, a doença! Assim como troco de sapatos acabo por quebrar um coração destinado a ganhar conhecimento com a minha existência, plenamente planeado e detalhado nos confins de algum lugar espiritual. A doença manifestou-se em muitas memórias anteriores, as palavras eram camufladas e conseguiam iludir-me. Mas hoje não consigo escrever sobre essa doença.
Quem sabe, amanhã. Hoje é noite de fazer amor com o meu corpo, uma vez que a alma se mantém intacta dentro de todos os meus órgãos. Politicamente incorrecta de se tocar mas completamente em liberdade para se fazer sentir ou pressentir. Toco na minha mão, neste momento e digo-vos que desisti do amor. Canto-vos essa conclusão, harmonia, pesadelo, sonho. Desisti e não volto a caçar, quem sabe daqui a uns anos.

12 novembro, 2011

Os loucos de espírito fazem amor com o próprio corpo,

O vento alcança os meus cabelos, massajando-os e cuspindo neles num rodopio malandro que me leva a ganhar um pouco mais de rugas de expressão. Quando tal fenómeno acontece, o simples plantar das rugas de expressão de indignação ou mesmo de felicidade, cai na minha alma o caminhar do tempo e a falta de vivência que posso estar a ter nos minutos que passaram e que vão passando à medida que penso no assunto. Trata-se de suposições, dúvidas que inflamam as minhas veias à medida que os pensamentos vão inundando a minha mente, a cada minuto e não há forma de carregar no botão de paragem para evitar um acidente de ondas dentro da minha cabeça. O vento vai continuando a massajar os meus cabelos com os lábios suaves, cuidados graças a uma operação violenta à pele (como se qualquer brisa conseguisse ter pele, as minhas divagações vão acabar por matar-me um dia).

Os meus braços encontram-se cansados de ver o mundo na primeira pessoa, de elaborar o meu estilo artístico na individualidade e na visão dos meus olhos castanhos de tons escuros. Nos momentos em que suporto o peso do (meu) mundo não consigo pensar em mais ninguém a não ser em mim, não vejo amor em qualquer segundo ser humano. Demasiado egoísta para usar o acessório de amigo a combinar com as minhas roupas, demasiado egocêntrico para mudar qualquer valor no meu planeta, nunca vou ser capaz de o melhorar. Os desejos percorrem os nervos faciais, irritando a pele morena do meu rosto bronzeado na tarde de domingo (naquele Verão em que trocámos demasiados beijos e juras eternas de amor que nunca vou quebrar), os desejos individuais e desnecessários. Se quero dançar no meio da minha casa coloco um impedimento na minha acção, como se tivesse mil olhos a julgar e a percorrer o meu corpo. E talvez seja essa a minha morte, daqui a alguns anos. Se o suicídio passar pelo meu coração, numa fase aparentemente excêntrica (é este o adjectivo que me faz pensar no quão difícil é conviver comigo mesmo nas tardes em que não existe absolutamente nada para fazer, quero apertar o meu próprio pescoço e fazer amor com o meu corpo, quero um segundo corpo para puder dar asas às minhas obscenidades), se a morte sorrir para a minha existência vou ter os mil olhares na minha mente e o medo vai apoderar-se da minha acção. Segurança, diriam algumas verdadeiras amigas estivessem a ler o que escrevo. Falta segurança nas minhas acções, acusaria uma delas na sua voz suave e melancólica, no mais pequeno pormenor até ao desenrolar da vida. Talvez seja por isso que me custa escrever cada vez mais escrever na primeira pessoa, existe uma insegurança apegada à vulgaridade existente na minha existência. Os meus braços encontram-se cansados de ver o mundo na primeira pessoa mas não querem passar essa tarefa para uma segunda pessoa, que conte a minha história com sentimentos deturpados por uma individualidade completamente diferente da minha. O meu vento alcança os meus cabelos e acaba por ir saboreando o meu corpo, com manias para o envelhecimento a cada dia que passa. O que vou fazer quando a juventude começar a desaparecer do meu corpo? Não quero afundar-me neste medo, meus caros.

Os meus monólogos deliciam-me, apodrecem a minha pureza mas nunca me senti tão bem em toda a minha vida. Nem fazem ideia do quando dava para ter o meu corpo separada da minha alma, neste momento. Existe um desejo obscuro de fazer amor com o meu corpo e chorar à medida que o amar intensamente nesses minutos – vou aproveitá-lo enquanto sou jovem.

E um viva aos loucos de espíritos! O vento continua a massajar os meus cabelos.