20 dezembro, 2011

Um cansaço a circular pelos dedos e a acumular-se nas vivências,


O cansaço acumulava-se no peso das vivências e circulava pelos meus dedos, à medida que o cigarro era consumido lentamente pela minha alma. Os lábios secos pelos dias e noites de Inverno não conseguiam tirar a essência da pequena substância graças aos ardores no meu espírito, transparente para quase todos os corpos que circulam pelo planeta e erram eficazmente quando a questão que enfrentam são as relações humanas. Sentado à janela, com os estoures quase levantados (em que não se via os pormenores deles), respirava o fumo para os vidros gelados. A neve que caia não tinha capacidade de fazer frente ao gelo que envolvia o meu coração. Depois de tantos abandonos, só conseguia pensar que o problema devia ser meu, da minha alma, da minha personalidade, dos meus cabelos, dos meus olhos, dos meus lábios. A frieza e um desprezo por um amor colocado num futuro tão próximo levariam a um afastamento da normalidade dos acontecimentos, nem o cigarro conseguirá aquecer os meus pulmões recheados de poluição alheia. Tenho o coração destruído, tenho-o calmo neste preciso momento como se nada conseguisse conquistá-lo ou destrui-lo, não existe qualquer reacção a um impulso enquanto estou sentado à janela, no meu mundo poderoso e controlado pelas minhas vontades. As depressões chegam mal um dos pés toca na zona fora da caixa, a tentativa de derrotar rotinas leva a essência de muitos para o esgoto. Uma luta por um vazio, quando as ambições são demasiadamente elevadas e a luz ao fundo do túnel desaparece, a primeira pela qual os olhos despertaram. A manta que enrolava as minhas pernas numa temperatura estável apareceu antes de começar a escrever, a ditar os podres da minha existência. Afinal sou demasiadamente introspectivo, penso demasiado em mim, comando a pensar no meu bem e esqueço-me de tudo o resto. Estou bem, estamos todos bem, basta a mente estar dentro deste modo, na individualidade de que todos os seres humanos são e devem ser capazes de conservar, amar e defender. Mas quando o gelo envolveu o meu coração, nem o amor-próprio escapou. Sob as diversas paredes que constroem uma casa, guardo um monstro. O monstro do abandono, que sente profundamente a ausência de diversas almas e pessoas (porque existe uma diferença abismal, se querem saber). Faltam uns segundos lábios, sente-se um “agora não dá” e promessas que foram feitas e conseguem aquecer. Existem os momentos em que não aquecem em que o medo se apodera das veias e desacelera o bombear do sangue. Os momentos de sufoco em que a mão prevalece sobre o peito, na tentativa de acalmar a caixa torácica, todos os órgãos que querem sair da boca. Desaparece em seguida, a confiança adquire as tonalidades do alma. Nunca existiu sentimento mais poderoso à face da Terra.

Solto lágrimas, a aparência do meu rosto desfalece na solidão da minha casa, o cigarro consome-se entre fumo e o arder natural, provocado pela chama minúscula. Essas lágrimas, nascidas da maior podridão, são o reflexo natural das escolhas individuais e alheias. As escolhas dos outros que condicionam e dão novos rumos, para conseguir dançar com os sapatos correctos. O cansaço teimava em acumular-se nos meus pulmões para me destruir, para deixar-me numa morte rápida e sem dor. Pouco me importa como estavam os meus cabelos nesse final de tarde, à medida que via o Sol a desaparecer num horizonte desconhecido, dou mais importância ao estado dos meus sentimentos. À elevação da emoção ao invés da racionalização, quem sabe da emotiva. Passava-me tudo pela cabeça, os beijos trocados, as partilhas efectuadas, a confiança conquista, os orgasmos atingidos. E sentia falta dos beijos e dos orgasmos, uma vez que as outras duas permaneceram. Mas é isso que falta? – Pergunto-me ainda muitas vezes. Beijos e orgasmos arranjam-se ao virar da esquina, se estivermos dispostos a não sentir mais. Vendem-se às prostitutas carnais, se for preciso. Mas é isso que me falta?
O meu coração não aguenta. Sente falta mas precisa de descansar. O Inverno leva-me a dar uma volta, na brisa gelada e no consolo do fogo. O cigarro queimou-se na solidão, entre os meus dedos. Deitei-o pela janela, quando entrou o frio. Os meus lábios ficaram ainda mais secos, os meus cabelos mais esgadelhados mas o meu coração continuou intocável. Intocável, é essa a palavra correcta. Um dia vai morrer e há segundos em que desejo profundamente, em outros faço uma vénia à eternidade. Quem sabe se não o faço à medida que escrevo. Tantas vezes penso que só escrevo merda.

10 dezembro, 2011

As ondas não lavaram a minha alma,



Isto é uma continuação disto. Ela nunca abandonou o meu coração e decidi contar um pouco do depois. Nunca ninguém conta essa parte, pois não?


Não me deixaste morrer, meu Deus, quando as ondas me levaram e lavaram os pés (envelhecidos pelo súbito aceleramento dos acontecimentos). As ondas do mar levaram-me para um lugar distante, geograficamente longínquo para não Te encontrar na tua casa, já que a tua duração na condição de humano duraria alguns anos até o contrato elaborado com o Diabo terminar. A minha mente, ao flutuar na água recheada de sal, entregava-se aos desvairos humanos e básicos que consumiam a minha existência, puxavam o instinto de sobrevivência adormecido em qualquer ser humano que cumpra as suas tarefas diariamente, sem qualquer alteração que faça para o Mundo, o seu mundo monótono. A fome consumia os meus pulmões, apunhalava o meu coração e derretia a alma que teimava em permanecer naquele corpo. Um fogo abrasador, electrificado com arrepios brilhantes e tensos pelo meu pescoço, flamejava e destruía a única verdade que existia: o amor, ao relembrar-me das lágrimas do rosto de Deus e o orgulho que lhe acelerava o sangue nas veias à medida que construía o meu corpo, perfeitamente esculpido com dedicação. Um amor por quem passava delicadamente as mãos pelo meu rosto, enquanto o movimento dos pés no chão de madeira ecoava ritmicamente. O som da música de embalar circulava tremendamente, colocando o planeta num sossego fantasmagórico. O amor apaixonado pelo criador da obra-prima, da escultura de anos. As minhas lágrimas misturavam-se com o gelo do mar, que levou-me para longe. Os meus pés estavam lavados, os meus sapatos envernizados perderam-se no fundo do oceano, nas rochas incapazes de saborearem qualquer raio solar. Os cânticos das sereias ouviam-se, na interrogação pelo desconhecido par que naufragava.

O amor perdeu-se nos dias em que flutuei no vazio. Os meus ossos não davam sinais de vitalidade sempre que os tentava mexer, as minhas lágrimas eram consumidas pelas ondas malévolas e cheias de interesse por uma essência diferenciada por sentimentos humanos, os pulmões pouco ou nada funcionavam graças às baixas temperaturas. O meu cabelo ganhou uma tonalidade cinzenta, o relógio biológico desfazia-se pela ausência de rotina, com pés de avestruz que decidiram correr para longe de mim. O meu amor não sobrevive a um ataque existencial, de todas as vezes que me recordo do segundo em que as ondas me levaram. A força das tuas mãos continuam agrafadas às minhas costas, a tua ânsia em te livrares de mim, quando reparaste que não existia perfeição em mim, derreteu-me a respiração (o motivo da minha sobrevivência). Não soltaste promessas, não colocaste palavras na boca para me aconchegar, unicamente colocaste-me no Mundo para Te encontrares. Um Deus recheado de amor e perdão era a última imagem que desenharia de ti, depois de tudo o que vivi, observei e senti. Os seres humanos nunca foram capazes de elaborar uma imagem tua, nem possuo capacidades para tal feito glorioso (e isso polui-me a alma). Mas os meus olhos conseguiram ver-Te. No corpo humano, nos cabelos claros, brilhantes e no corpo perfeito que apelava por sexo. Um sexo caloroso, recheado de orgasmos pelo meio e uma violência divina. À medida que as ondas me levam, recordo-me dos teus lábios, sôfregos, sólidos e excitados. Carregados de força para possuírem todos os tecidos da minha alma, absolutamente guardada para feitos heróicos. Os feitos de Hércules estavam tão longe de mim e pensava que, no fundo, iria ter algo semelhante a ele, queria tê-lo conhecido. Não esperava pela força que exerceste sobre mim, quando cai para as ondas do mar me levarem. Elas levaram-me, deliciadas pelo cheiro a traição que ficou no ar. Levaram-me e arrastaram-me para um infinito sem definição, graças à falta de conhecimento de qualquer coisa que nunca foi alcançada por uma pessoa. Que nome reles, pessoa. Ou então coisa, porque era isso que eu era, sabem?


Pergunto-me se o amor ainda existe. A minha alma foi lavada de ressentimentos, mágoas, desilusões. Quando é que a força das tuas mãos me vai abandonar? Leva-me contigo, para o teu trono depois das nuvens. Como Zeus, que o Olimpo e todos os deuses que viviam com ele. Como te chamas para além de Deus? Oh, deixa-me morrer então. Oh, deixa. As ondas lavaram-me os pés mas não me lavaram a alma, como seria de esperar.


03 dezembro, 2011

Na sombra do coração,

Esconde-te na sombra do meu coração, para não te encontrar, para não te amar mais uma vez. Esse sentimento repleto de complexidade, de raízes terríveis, não me deixa viver. Não existe a possibilidade de respirar tranquilamente ou de cortar os pulsos com toda a dignidade. Há uns dias não consegui colocar a corda na pele do meu pescoço, não tive coragem suficiente para atirar-me ao mar violento naquele dia recheado de nuvens enraivecidas, não ganhei capacidade de engolir dezenas de comprimidos devido ao peso do meu coração.
Pesou tanto nos segundos fatais que me puxou para trás e trouxe oxigénio de volta aos meus pulmões, parados pelo perigo da paixão e pelas turbulências dos fascínios alheios a qualquer racionalidade. Os meus olhos costumam devorar beleza física num primeiro momento, antes da boca abrir para explorar terrenos longínquos ao olhar humano. Falta-me riqueza de emoções ou então talvez a tenha em demasia - quem sabe, nestes dias tenebrosos? O meu coração pesou tanto nos segundos fatais que acabei por voltar atrás na decisão de terminar com os meus sonhos, de cortar as asas e nadar no meu sangue.
Não te guardo nas sombras do meu coração, tenho demasiados retalhos, escadarias e varandas construídas com desilusões e mágoas ao longo do tempo. Não te guardo nas sombras, coloco-te no lugar mais exposto ao Sol, ao calor da minha felicidade. Sinto os teus pés aconchegados em alguns dos meus músculos e enrolados em qualquer artéria, onde circula o sangue a velocidades extraordinárias, que mantém quente qualquer pedaço do corpo humano. Não faças das minhas sombras um lugar privilegiado, deixa-me colocar-te no devido lugar, onde tantas vezes estou prestes a começar todos os fogos. A tua coroa na minha cabeça puxou-me para trás na hora em que queria deitar no esgoto a minha mortalidade. É amar, é amar em dias tenebrosos e fantasmagóricos, sem ter a ânsia de destruir o teu reino, sem ter vontade de destruir-te. Não te vejo na escuridão a partir do momento em que me sento no trono ao teu lado, não vou desaparecer quando a morte beijar o meu peito.
São fracos, os pobres de espíritos. São loucos, os extravagantes e ricos de emoções quando não sabem controlar. São vulgares, os equilibrados na alma. Vivem felizes.